A cada dia mais penso ser possível construirmos uma educação integral, enquanto concepção, e processos de educação em tempo integral, enquanto práticas (não dicotomizadas), que partem das relações humanas e culturais entre as pessoas e grupos, reconhecendo e valorizando os seus saberes prévios, suas diferentes diferenças e múltiplas semelhanças. Esta é a base do que chamo de um currículo intertranscultural.
Será tão difícil entender esta possibilidade? Em meu livro "currículo intertranscultural" dou 14 indicações deste currículo. E, em outras publicações, temos avançado nessa reflexão. Quanto mais articularmos escola - comunidade - bairro - cidade - município, potencializando os processos educativos que as envolvem, mais estaremos contribuindo para a qualidade sociocultural e socioambiental da educação que praticamos, em todos os níveis e modalidades educacionais.
Município que Educa busca a articulação intersetorial e intersecretarial de ações, superando os isolamentos de toda ordem, a fragmentação do conhecimento, das pessoas, das relações, da própria vida. Enquanto não buscarmos formas mais humanizadas e coletivizadas, transparentes, democráticas, éticas, estéticas, sensíveis, críticas e políticas de convivência, continuaremos a viver (e a apoiar, pela negação de tudo isso), práticas desumanas, injustas, corruptas, competitivas.
Ao encontro destas necessidades, já tenho discutido sobre currículo, educação e pedagogia intertranscultural... conceitos trabalhados em livros e artigos que tenho publicado - entre os quais "Currículo Intertranscultural" (2004), "Educar em Todos os Cantos" (2007), Educação Cidadã, Educação Integral" (2010), além de artigos disponĩveis neste meu próprio blog, quando discuto  "Pedagogia Intertranscultural". São conceitos e práticas em processo, em construção, que, certamente, não serão compreendidos, nem aceitos, nem valorizados enquanto práxis, por quem pensa de forma cartesiada e, pior que isso, de forma linear, conservadora, arcaira e rançosa, como diria Mário Sérgio Cortella.
Estou farto desses cientistas "neutros", "competentes", que produzem artigos uns após outros,  enchendo-se de pequenos títulos, de pós-doutorados, e se achando o máximo porque fizeram um ou outro curso fora do país... valozirando os seus "currículos lattes" que permitem que disputem migalhas sempre distribuídas entre os seus próprios iguais. Não é deste tipo de educadores e de intelectuais que o nosso país precisa. Necessitamos de "intelectuais orgânicos", como nos ensina Gramsci, que assumam também para si a responsabilidade da luta pela justiça social, pela distribuição mais justa da riqueza e que saibam que todos e todas são importantes numa sociedade que busca a "felicidade interna bruta", para além do "produto interno bruto".
A concepçao de educação do Município que Educa, que bebe na fonte de tantas experiências transformadoras e mudancistas, contribui para a superaçao dessa visão cinzenta de um currículo "moderno", de uma educação parcial (para os pobres), e sempre de cima para baixo, portanto não dialógica, arrogante e autoritária, que insiste em não se modificar, em continuar a mesma, porque mantém privilégios, principalmente de pessoas e grupos que não se comprometem com a superação da desigualdade social.
Evidentemente, não podemos generalizar quando fazemos a crítica a um certo tipo de visão educacional ainda acedemicista, cartesiana e rançosa em pesquisa e em educação. Nem tampouco generalizamos e dizemos que há muito mais de maquiagem do que verdadeiramente de aprendizagem, se observarmos com mais atenção diferentes experiências educativas em todos os níveis de ensino. Até por isso devemos estar atentos à contribuição dos movimentos sociais e populares, das organizações da sociedade civil,  do Estado e de todos os que trabalham com educação e pesquisa, para que este movimento seja o mais amplo e democrático possível, incluindo-se aí também a melhor distribuição dos recursos públicos para viabilizar o sonho de toda a sociedade e não apenas de uma elite, de uma minoria que insiste em se perpetuar no poder, nem sempre, infelizmente, de forma ética, muito menos estética e honesta.
A boniteza do sonho de uma sociedade mais justa e mais feliz, da qual sempre nos falou Paulo Freire, exige de nós esta indignação, a denúncia e o anúncio de que para que um outro mundo e uma outra educação sejam possíveis, há muito o que fazer para acabar com os privilégios, com a corrupção, com a falta de transparência de toda ordem, com a falta de humanidade, de justiça e de esperança, infelizmente ainda tão presentes em nossa sociedade. Daí a necessidade da educação integral do nosso povo, para a construção de uma outra sociedade, de municípios que educam e se educam reciprocamente, porque educados pelas pessoas, com base numa convivência mais sensível, crítica, criativa, mais verdadeira, "humanescente", propositivamente mudancista e transformadora.